*/Caesalpinia echinata/** *
Já não existe pau-brasil
em estado selvagem.
Consumimo-lo até às últimas exsudações
do ar que se respira.
Sufocamos.
Dele resta apenas um colar de vermelhas
sementes
a dar três voltas ao pescoço
com blusas de veraneio.
Levei um pé de uma vez
para o Jardim Botânico de Lisboa
muito contente por assim suprir
uma grave falta
pois nada havia nele
a representar a tão famosa espécie
dadora de magnífica madeira
e que em Botânica se identifica
com o nome de /Caesalpinia echinata/.
Pau-brasil de
cor de brasa
cor de brasa é a resina
Brasil de brasa nasceu
como o fogo no braseiro das palavras.
Levei um pé de pau-brasil
do Horto Botânico do Rio de Janeiro
para a Escola Politécnica em Lisboa
e ninguém avisou que isso era proibido.
Ignorava então que
NÃO SE PODEM TRANSPORTAR ESPÉCIMES VIVOS
DA FLORA E FAUNA ESTRANGEIRA.
Nem no Brasil impediram
mais um gesto de extinção
nem na alfândega portuguesa
o crime de eventualmente introduzir
uma espécie capaz de se transmutar numa praga.
Levava a plantinha num cesto
os ramitos de fora a espreitar
e ia falando com ela
para que não se assustasse na rua
nem no momento de o avião descolar.
Pequenita - ia dizendo.
Dei-lhe água no hotel
fazia-lhe festas nas folhas
e assim levava o pezinho bem à vista
orgulhosa do pau-brasil.
Nem a polícia reparou
nem comandante do avião
nem comissário de bordo
e ainda menos hospedeira
à saída do Brasil.
O mesmo desdém em Lisboa
à passagem inocente
pela zona em que nada há a declarar
da tão terrível alfândega.
Saí do aeroporto de braço dado com o pezinho
vivi uns dias em casa com ele
até proclamar no Jardim Botânico
que tinha uma oferta especial
que supria a falta da espécie
no catálogo das celebridades.
Uma espécie tecnicamente extinta
que só sobrevive sob cuidado humano
na área da domesticidade
como os caniches pequenos
ou os ligres nos jardins zoológicos
híbridos de leão e tigre.
Fez-se uma festa importante
Nos importantes atos da Festa da Sciencia
Com discurso do diretor
Fernando Catarino
O famoso botânico.
Plantou-se com ritual
aquele pezito distinto
no científico arboreto do Jardim Botânico.
E depois a plantinha começou a entristecer
devia ser falta de mim ou da ditosa pátria sua amada
declinou a olhos vistos
sem chegar a pegar nem a crescer
e assim morreu a ilusão
deixando no entanto estes avisos
de não transportar espécimes vivos
de lugar para lugar
e a esperança maior
de a /Caesalpinia/ ser o símbolo
da vitória do Brasil
sobre toda a adversidade.
Maria Estela Guedes
Extraído de «Arboreto» (inédito)
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